Falta de plataformas multimídia e ausência de um modelo de negócio confiável para as escolas também são outros embates
via Revista Educação
Imagine um espaço tomado por telas e dispositivos eletrônicos, onde os visitantes se aproximam de um painel sensível ao toque (que reconhece impressões digitais) e acessam um vasto acervo de obras que permite navegar por cenários tridimensionais e interagir com os personagens. Trata-se do que se imagina ser a biblioteca do futuro, segundo Oscar Oliel, vice-diretor do Sistema de Bibliotecas da Unicamp. “O livro em papel vai perder espaço progressivamente, e o digital vai dominar o mercado”, afirma Oliel – que controla um acervo híbrido também com obras impressas.
Os livros digitais também têm potencial para transformar a forma como o aluno interage com a informação: “Não se trata apenas de uma mudança de suporte, mas de uma nova experiência de leitura e aprendizado”, afirma a bibliotecária e pesquisadora Liliana Giusti Serra, responsável pelo desenvolvimento dos softwares de gestão de bibliotecas SophiA e Philos. Ela cita o best-seller Our Choice (Al Gore, 2009, R$ 20), em que o leitor é convidado a interagir com gráficos e navegar por vídeos narrados a partir de dispositivos como o iPhone.
A composição da história também se transforma com as obras criadas para meios multimídia. O Google lançou recentemente um livro que combina trechos de dois diários e constrói uma história diferente para cada leitor. “É uma experiência mais ativa, que reforça o protagonismo do aluno e estimula a criatividade”, diz Liliana, doutoranda em Ciência da Informação pela Unesp.
A leitura digital cresce no Brasil e impulsiona o mercado de e-books, segundo pesquisa anual do Ibope. Estima-se que 26% da população já tenha consumido livros digitais pelo menos uma vez na vida. O relatório Global eBook: a report on market trends and developments, que traz dados mundiais sobre a venda de e-books, mostra que 7% do que é vendido no Brasil se deve aos livros digitais, embora o mercado ainda seja instável.
Já nos EUA, as vendas de e-books caíram cerca de 4% em 2017, repetindo a mesma queda em 2018, de acordo com dados da Associação Americana de Editores (APA). Os livros impressos, por sua vez, teriam se mantido estáveis, com pequena alta (2%) no ano passado, de acordo com a publicação Publishers Weekly.
A primeira grande barreira dos e-books é a resistência ao digital. Pesquisadores das universidades britânicas de Plymouth e Bristol sugerem que nosso nível de compreensão é menor na tela do que no papel – e que os dispositivos eletrônicos são “motores de estresse”. O influente escritor americano Nicholas Carr, autor do best-seller Geração superficial, vai além ao afirmar que não há como oferecer vivências profundas na tela, uma vez que a Rede está inserida na “ética industrial” e já nasce contrária à contemplação.
O time de especialistas que aposta nos benefícios do digital, no entanto, não teve o mesmo êxito. Um dos estudos mais completos realizados nos Estados Unidos pela Scholastic, um grupo de mídia e educação, e pela consultoria Harrison Group, revela que o estímulo à criatividade e à leitura é um dos principais benefícios dos livros digitais à educação básica – e que mais da metade das crianças (57%) se sentem estimuladas com o uso de leitores digitais.
O segundo grande desafio é popularizar os tablets nas instituições de ensino e consolidar um modelo de negócio que ofereça licenças digitais para o uso coletivo. As grandes editoras seguraram por alguns anos as primeiras iniciativas, receosas de seguir o destino autofágico da indústria da música. Ao longo da última década, porém, passaram a oferecer licenças digitais perpétuas, capítulos online e até contratos anuais a partir de licenças individuais em grande número.
No ano passado, o livro de ficção A máquina, de Adriana Falcão, estava esgotado nas livrarias. A opção da bibliotecária Elisabete Feitoza, do Centro Educacional Pioneiro, uma escola particular de educação básica, foi adquirir a versão eletrônica. “Entramos em contato com a editora e compramos o livro digital, que pode ser acessado nos dispositivos eletrônicos de leitura na nossa biblioteca”, diz. “É uma licença vitalícia, mas ainda temos um certo receio em relação ao futuro”, afirma. Antes de adotar a obra, a escola teve de revisitar suas diretrizes institucionais, compartilhar a informação com os coordenadores e espantar qualquer sombra de insegurança. O livro não tem recursos além da versão impressa, mas o software que o carrega permite ao professor monitorar o tempo dos alunos em cada capítulo e as pesquisas feitas durante a leitura. Atualmente, o Pioneiro tem 32 obras virtuais, alguns audiolivros e obras de licença livre. A maior parte do acervo (12 mil livros), porém, está nas prateleiras.
O ensino superior está um passo à frente. Assim que o MEC permitiu o acesso digital ao acervo bibliográfico complementar dos cursos de graduação, a chegada dos livros digitais avançou nas universidades. Quatro grandes editoras de livros acadêmicos (Grupo A, Grupo Gen-Atlas, Manole e Saraiva) criaram um consórcio chamado Minha Biblioteca e passaram a oferecer às instituições pacotes de publicações.
As Faculdades Rio Branco fizeram a primeira grande experiência com as licenças virtuais no ano passado. Elas adquiriram 1.500 licenças (uma por aluno) e ofereceram a cada um oito mil obras virtuais. “Os estudantes podem ler pelo celular e até imprimir partes da obra, sem ferir os direitos autorais”, diz o diretor-geral da instituição, Edman Altheman. As três grandes vantagens, segundo ele, são o custo (R$ 2 a R$ 4 por ano por aluno), a atualização automática dos conteúdos pela editora e a economia de espaço físico nas dependências da instituição.
Fonte: Revista Educação | http://www.revistaeducacao.com.br
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