O Desafio da Aprendizagem Criativa, que leva educadores ao Massachusetts Institute of Technology (MIT), dá exemplos de pedagogia prática e que gera bons resultados
Por: Paula Calçade
Fonte: https://gestaoescolar.org.br
Uma educação fora do modelo convencional e distante da lógica do giz e lousa pode estimular a implementação de soluções inovadoras para os currículos escolares. Na Aprendizagem Criativa, os professores podem fazer uso de novas tecnologias, mas não somente elas, e sim um processo de pensar a aula dentro de uma abordagem diferente. “Em mundo no qual as coisas são incertas, as pessoas precisam lidar com as situações de forma criativa e essa é uma abordagem adequada ao nosso tempo”, afirma Leo Burd, diretor do Lemann Creative Learning Program no Media Lab do Massachusetts Institute of Technology, nos Estados Unidos. Segundo o especialista, a metodologia prepara os alunos de acordo com a realidade em que vivem. “Inclusive as futuras”, diz Leo.
O programa Aprendizagem Criativa leva professores para vivenciar essa abordagem no MIT Media Lab, onde discutem e apresentam projetos nesse conceito. Segundo Leo, a Aprendizagem Criativa ajuda a tornar a educação brasileira mais mão na massa, significativa, colaborativa e lúdica.
Raimundo Melo e Talita de Souza são educadores sociais e pensam a tecnologia associada à educação junto à Secretaria de Educação do Estado do Rio Grande do Norte e à ONG Centro de Documentação e Comunicação Popular (CECOP). Juntos desenvolveram o Projeto “Fotografia, Memória e Identidade”, que promove a fotografia como meio de formação da identidade de alunos de uma comunidade rural e quilombola em Ipanguaçu, no interior do estado. Eles participaram do programa no MIT e tiveram contato com trabalhos de outros pesquisadores e professores em aplicação da Aprendizagem Criativa.
Várias experiências devem ser replicadas aqui no Brasil. “Aqui a estrutura educacional pode ser limitante, mas estamos pensando estratégias diferentes para a educação”, aponta Raimundo, ressaltando que grandes mudanças podem ser feitas já: “Não é preciso esperar todo o sistema educacional mudar, podemos adaptar agora. O professor tem uma autonomia relativa nisso, pode observar os processos de aprendizagem e fazer diferente”.
O projeto de Raimundo e Talita desenvolve um museu comunitário nas aulas de História e Artes da escola municipal do Quilombo Agrovila Picada – expondo a história local para todos que vivem na região. O conceito parte do que o aluno já sabe sobre fotografia e imagens postadas nas redes sociais. Pegando carona no interesse dos alunos, o projeto mostra que registrar momentos é contar a própria história. O principal resultado do projeto é a maior atenção dos alunos nas aulas. “A produtividade fica maior se os adolescentes veem uma aproximação do conteúdo dado em aula com a realidade de sua comunidade”, diz Raimundo. “E a comunidade vai para dentro da escola, que por sua vez não fica isolada”.
E outro Raimundo criou o Projeto Social Robótica Educacional Ação Parceiros, em Santa Bárbara, no interior do Pará. Formado em Matemática e Eletrônica, Raimundo Xavier deu aulas na comunidade e hoje se autodenomina orientador educacional, levando a aprendizagem de robótica na construção de robôs com materiais reaproveitáveis e de fácil acesso. “Nós não temos muitos recursos, vivemos em um município com um dos piores IDHs brasileiros”, diz Raimundo. “A garrafa pet é o grande objeto usado para montar esses robôs”.
O orientador social explica que a sede do projeto é frequentada por jovens de escolas públicas do município paraense e que, após a viagem ao MIT, ele está adequando o espaço para projetar uma escola longe do modelo tradicional. “Produzimos mesas com materiais reaproveitados, tiramos as paredes das salas, integrando o ambiente para as aulas”, afirma. Mas Raimundo Xavier lembra que todas as escolas podem implementar mudanças pequenas e introduzir a aprendizagem criativa: “Desde de que a escola conheça a comunidade, procure o que existe ao redor, é possível encontrar uma solução de fácil acesso e que possa trazer todos para dentro da escola”, pontua, enfatizando que um coordenador pode selecionar primeiro o problema mais simples e começar a desenvolver um projeto para sua escola.
Leo Burd lembra que muitos dos projetos que acompanhou no programa do MIT não exigiram muitos recursos. Para se ter uma ideia, contar com equipamentos eletrônicos não era requisito. “Muitos educadores propunham a criação de espaços em que os estudantes pudessem explorar ideias, fora e dentro das salas”, ressalta. Segundo Leo, o primeiro passo para trazer a abordagem de Aprendizagem Criativa para uma escola é partir de um evento que promova a interação prática entre alunos sobre algo que aprenderam na classe. “Dá para começar com algo pequeno para experimentar e, assim, os projetos vão surgindo”, pontua.
É possível replicar na sua escola
Para ficar claro, a limitação de recursos não deve funcionar como razão para não implementar uma visão diferente na escola, que pode começar durante uma formação com professores. “Trabalhamos no limite da escassez, nem sempre os equipamentos estão disponíveis, então dividimos os alunos em grupos e, dependendo da temática, é até bom”, afirma Raimundo Melo. Segundo ele, o uso compartilhado dos recursos pode render bons frutos, aproveitando o fato de que muitos jovens vão para a escola com seus celulares. Raimundo acredita que, além de formação, é importante ter em mente a disposição de buscar parcerias com o terceiro setor e com as secretarias para a aplicação de projetos, como acontece com o “Fotografia, Memória e Identidade”.
Já o criador do projeto de robótica no Pará enfatiza que não é preciso fazer uma mudança física na escola para trazer novos ventos. “Se você tem apenas uma sala já é suficiente”, diz Raimundo Xavier. “Tente construir um ambiente atrativo, use papelão, por exemplo”. As criações dos alunos podem ser explicadas em papel e materiais baratos e recicláveis, como garrafas plásticas e palitos de sorvete podem se transformar em outra coisa. “Criamos um carrinho com garrafa PET e isso deixou os alunos atraídos pelas possibilidades e orgulhosos do que fizeram”, conta.
O primeiro passo para a aplicação de projetos como esses é o coordenador ter determinação para dinamizar e introduzir práticas inovadoras, rompendo com a rotina tradicional. “O segundo passo é o professor pensar como sua disciplina pode contribuir para a comunidade escolar”, pontua Talita. Raimundo Melo diz que não faz sentido estudar biologia sem pensar na realidade local, como a devastação ambiental presente nos arredores da escola. A aprendizagem criativa introduz o questionamento sobre as realidades, diz. “É possível elaborar um projeto de arborização, por exemplo”, afirma.
Para Talita, o interesse do aluno vem em consequência das mudanças no currículo tradicional. “Os alunos colocam a mão na massa e as possibilidades de aprendizagem se ampliam porque a comunidade também tem expectativas com a escola e se sentem parte dela”. As fotos tiradas pelos alunos da escola municipal do Quilombo Agrovila Picada são parte de um acervo que está disponível para todos. Além disso, o mapeamento feito pelos estudantes antes da produção fotográfica os auxilia a compreender a geografia e a disposição humana em sua região, contando a história local. “É sair da escola e, ao mesmo tempo, convidar pessoas para dentro também”, enfatiza Talita.
Repassar essas ideias aos professores pode ser um desafio, mas Raimundo Xavier ressalta a importância de uma formação continuada para os docentes, que pode ser estimulada através de experiências que tiveram bons resultados. “Existe muito conteúdo disponível na internet, a Rede Aprendizagem Criativa mostra muitos caminhos e é possível desenvolver ideias próprias e para diversas realidades a partir do que já foi feito”, comenta. Leo Burd lembra a importância de incentivar os professores que já estão trabalhando com projetos inovadores e que isso acaba inspirando os outros. “Ver os colegas trabalhando é a melhor forma de começar uma nova atividade”, conclui.
Por: Paula Calçade
Fonte: https://gestaoescolar.org.br
Postado por: ABIME