Mudança no Novo Ensino Médio também enfatiza a formação integral do estudante que consiste no desenvolvimento – além de aspectos cognitivos – das competências socioemocionais
O novo ensino médio apresenta grandes desafios para sua implementação. O marco legal e normativo (Lei nº 13.415/2017, Resolução CNE/CEB nº 03/2018 e Resolução CNE/CP nº 04/2018) deixa diversas possibilidades de construção dos currículos e de organização da oferta, a fim de atender às expectativas das diversas juventudes que compõem o universo de estudantes do ensino médio. Dá aos mesmos o protagonismo para definir a trajetória formativa que melhor dialoga com seu projeto de vida.
Leia: Novo ensino médio: currículo nunca foi tão discutido
Cabe lembrar que o novo ensino médio propõe uma ruptura com o modelo único de currículo ofertado atualmente. Hoje, o processo de ensino e aprendizagem é realizado de forma fragmentada e superficial, independente das trajetórias que irão percorrer. E ao final do ensino médio, os estudantes desenvolvem o mesmo conjunto de conhecimentos de todas as áreas, impedindo que haja um aprofundamento dos objetos de conhecimento mais relevantes para a trajetória profissional que pretendem seguir.
Para instigar o jovem
Ao propor uma organização curricular com uma parte focada na formação para a vida, onde devem ser desenvolvidas as competências e habilidades essenciais previstas na BNCC, e uma outra parte focada na preparação para as carreiras profissionais, organizada a fim de permitir ao estudante escolher os temas que deseja aprofundar, o novo ensino médio busca permitir ao estudante construir um percurso formativo mais atraente e sintonizado com seus anseios e expectativas.
Sendo assim, essa nova implantação nos últimos anos da educação básica tem como base quatro pilares fundamentais que orientam as novas formas de oferta curricular. O primeiro deles trata da flexibilização/diversificação do ensino médio por meio de currículos que permitam a diversificação da oferta de unidades curriculares dentro da carga horária regular, uma vez que as escolas poderão se organizar com oferta de diferentes percursos formativos para o estudante do ensino médio.
Outro pilar está relacionado com a possibilidade de oferta de formação técnica e profissional dentro do currículo regular viabilizando uma formação profissional para o jovem ainda dentro do ensino médio sem exigir sua matrícula em tempo integral. A formação integral do estudante se constitui no terceiro pilar e consiste no desenvolvimento, além de aspectos cognitivos, das competências socioemocionais.
De olho na Base
Por meio das 10 competências gerais da BNCC e das habilidades previstas nos eixos estruturantes dos referenciais para elaboração dos itinerários, a formação integral ganha relevância na parte da formação geral comum, mas também na parte dos itinerários.
Finalmente, o conceito de educação em tempo integral presente no marco legal envolve a ampliação do número de escolas de tempo integral, mas também permitindo que o processo de ensino e aprendizagem se dê em ambientes diversos da escola de matrícula do aluno, com diversas possibilidades de cômputo de atividades extra escola na carga horária do estudante, desde que haja intencionalidade pedagógica e acompanhamento de um docente da escola.
Na parte da formação geral básica do currículo devem ser desenvolvidas, sobretudo, as competências e habilidades previstas na BNCC, enriquecidas pelo contexto histórico, econômico, social, ambiental, cultural local, do mundo do trabalho e da prática social, devendo ser organizada por áreas de conhecimento (linguagens e suas tecnologias, matemática e suas tecnologias, ciências da natureza e suas tecnologias, ciências humanas e sociais aplicadas) aprofundando e consolidando as aprendizagens essenciais do ensino fundamental, a compreensão de problemas complexos e a reflexão sobre soluções para eles.
O currículo por área de conhecimento deve ser organizado e planejado dentro das áreas de forma a romper com o trabalho isolado apenas em disciplinas. Para tanto devem ser criados espaços de ensino e aprendizagem que garantam, sendo assim, a interdisciplinaridade dentro da área com a integração e planejamento coletivo dos docentes das disciplinas que compõem cada área do conhecimento.
Aluno ativo e os itinerários formativos
O protagonismo do estudante tem como ponto central a construção e viabilização do seu projeto de vida, por meio do qual ele define sua trajetória, acompanhando o desenvolvimento da sua identidade. Assim, é papel da escola auxiliar os estudantes a aprender a se reconhecer, considerando suas potencialidades e a relevância dos modos de participação e intervenção social na concretização de seu projeto de vida.
Já a parte dos itinerários formativos é composta por um conjunto de situações e atividades educativas que os estudantes podem escolher conforme seu interesse, para aprofundar e ampliar aprendizagens em uma ou mais áreas de conhecimento e/ou na formação técnica e profissional.
Eles podem ser organizados, por exemplo, por meio da oferta de diferentes arranjos curriculares, devendo considerar as demandas e necessidades do mundo contemporâneo, estar sintonizados com os diferentes interesses dos estudantes e sua inserção na sociedade, o contexto local e as possibilidades de oferta dos sistemas e instituições de ensino.
Os itinerários devem garantir a apropriação de procedimentos cognitivos e o uso de metodologias que favoreçam o protagonismo juvenil, e organizar-se em torno de um ou mais dos seguintes eixos estruturantes: investigação científica, processos criativos, mediação e intervenção sociocultural e empreendedorismo.
Revisão dos currículos
Na elaboração e revisão de currículo do ensino médio, é importante observar que os sistemas de ensino são os responsáveis por definir o documento curricular para orientar a elaboração da proposta pedagógica de cada unidade escolar.
A partir da elaboração do documento de referência do território ou das redes, observados a BNCC e as Diretrizes Curriculares Nacionais, o respectivo conselho de educação tem a responsabilidade de indicar como deverá ser feito este processo, acompanhando e supervisionando a construção ou a revisão dos currículos do ensino médio.
Cabe salientar que a implementação do novo ensino médio em cada território exige atuação em regime de colaboração das entidades educacionais dentro de cada estado e também com a União.
Para além do conteúdo
Por tudo isso, pode-se concluir que a nova configuração curricular do ensino médio brasileiro é um desafio ímpar para o sistema educacional e exige disposição para romper modelos mentais estabelecidos e capacidade de pensar de forma inovadora e criativa.
Neste sentido, olhar para as diversas juventudes que compõem a sociedade e, consequentemente, a escola movendo o foco para o protagonismo do estudante e para o desenvolvimento de competências ao invés de um ensino baseado no conteúdo, abre diversas oportunidades para melhoria da aprendizagem, redução da evasão e formação de um egresso com perfil mais sintonizado com as demandas da sociedade do século 21.
*Eduardo Deschamps presidiu entre 2016 e 2020 as comissões do Ensino Médio e BNCC no Conselho Nacional de Educação e é conselheiro do Conselho Estadual de Educação de SC
Fonte: Revista Educação
Publicado por Abime